Encruzilhada.

Viu-se da sombra apenas o cabelo fogo e o balaio debaixo do braço; cor do homem: indistinta.
Fez-se reza braba na encruzilhada, ele circunvagando o cesto de tranças lânguidas. Da sombra observei o gibão e da encomenda luzidia, fechei os olhos.
Quase três horas da manhã e o próprio cão esperando o diabo.
"Ínterim!" Praguejou o homem, mas balaio bom é coisa-feita incomutável.
Ouviu-se urros, berros, gruídos, patas, cascos, trotes e o ar modesto escondeu a desgraça em sua cerração.
O balaio tremeu! O balaio chorou! O balaio gemeu capitoso. A encomenda - não sei explicar o que era -, mas o que saiu dali arrepiou meus cabelos e tingiu de sangue a minha retina. E a linda vestal coberta de morim latente no halo pétreo lançou-se ao demônio sem face que ainda urrava com grande fúria.
Ela: leniente; ele: assomado.

Ele a comia como a um bibelô sagrado que é posto na mesa para encher os olhos e a boca d'água.
Sendo moça atinada, enroscou as coxas na cintura do cão e dos lábios dele recolheu um taco; todos os quatro caminhos, um de barro, outro de pedra, um de asfalto e o outro desconhecido pelos mortais, abriram-se em brasa aromática engolindo o riso lúbrico do homem malfadado.
Tremi mais que bambu em ventania, pedindo a Deus e a boa Maria que me guardasse a alma, os filhos e a vista dessa noite infernal; e ainda me deixei ver a moça chupar o homem como se este fosse o figo docinho que dá no fundo do meu quintal. Chupou-o tanto que se aquele ser não-terreno tivesse um caroço, ela o encontraria sem demora.

Reforcei apressada as trancas das janelas, beijei os filhos que dormiam como os anjos, mas me faltou a coragem de beijar a boca do homem que divide a cama comigo.
Esquálida, desviada do meu destino, contemplo o resto da cena imprópria.
Sucedeu-se que a moça foi engolida, após a cópula, pela fenda que se abriu no chão com balaio e tudo enquanto a sombra seguia com seu gibão pelo caminho imortal, revigorado.
E por hábito hebdomadário, sempre em noites que me foge o sono, a sombra-cão-homem-demônio retorna a velha encruzilhada com um cesto novo incircunscrito.


- Gostaram? Eu ando com a mente fértil ultimamente...

10 Comentários:

Anônimo comentou:

DEIXEI UM SELINHO PRA VOCE NO MEU BLOG , DA UMA OLHADINHA LÁ ... ^^

Beijos e adoro teu blog ..
Lary ♥

Nati Pereira comentou:

Teu pequeno conto me fez lembrar das músicas da Bahia, Mpb e tals. Gostei :D
Beijo

Inercya comentou:

Mente bastante fertil sim. Haha
É sempre bom aproveitar pra escrever quando a mente está a mil.
Confesso que precisei ler mais uma vez. E na segunda, ficou bem mais claro para mim.
Intrigante, meio confuso, mas muito bem escrito. Sinceramente, gostei muito.
;*

Naia Mello comentou:

ahauahua. Sim.
bem bolada toda a trama.

Carol Winchester comentou:

Nossa, você escreve muito bem. Confesso que fiquei meio perdida na história... Não conheço muitas palavras daí D:
Acho que tá na hora de eu ouvir a minha professora de ingles e parar de ler literatura britanica/americana onde só tem palavras faceis D:

Diana Góes comentou:

Adorei!
Não sei bem o significado de metade das palavras, mas entendi bem o contexto, ficou muito bom!
beijos

Nina Auras comentou:

Adorei o blog, e o texto. Sem comentários sobre ele, maravilhoso *-* Não consegui entender o que era hebdomadário até procurar no dicionário, KKKK.

beijões :*

Kauana da Costa Rosa comentou:

Adorei o post =)
seguindo aqui !!

Anônimo comentou:

Tá legal, só não imaginava um texto assim vindo de você... Mas as pessoas surpreendem né? ;)
E não gostei do 1º comentário, blz? ¬¬'

Unknown comentou:

Não tem nada a ver com as músicas da Bahia e digo isso pq sou baiana.

 
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